quarta-feira, 16 de julho de 2008

Elevador II - Sobre aquele senhor.

Meu livro era novo, novinho... E como acontece sempre com as novas paixões, a gente não se largava por nada. Nem pra descer o elevador.
Até que numa quinta feira eu estava indo para o trabalho, entretida com o meu mais recente affair, quando aquele senhor entrou, apertou o número 2 e me cumprimentou.
Diante da interrupção respondi com um breve aceno de cabeça sem tirar o foco das palavras.
Não percebendo a minha impaciência ele resolveu alongar o assunto:
- Indo pra aula é?
Fui obrigada a levantar os olhos e me deparei com uma figura frágil e com uma aparência infantil apesar da idade.
- Não, tô indo trabalhar. Da aula eu já cheguei.
E continuei. Ele também:
- Isso mesmo menina, estuda e trabalha mesmo que é a melhor coisa que faz. Você que é jovem, lê uma coisa uma vez só e “pum!”, já entra na cabeça! Já eu ó, leio, leio, leio e num entra!
E batendo com as mãos na cabeça deu uma risada sonora.
Forçando uma simpatia escassíssima em mim naquele momento respondi:
- Que isso, não é assim não...
- Mas sabe que eu estudo até hoje?
- É?
- É, leio muito!
Percebendo que ele não iria parar até chegar ao seu andar, busquei um assunto e lembrei-me da figura do meu avô com sua eterna persistência.
- Que legal. Meu avô passou num concurso pra cartório com 70 anos, também não parou até hoje...
Assim que acabei de falar uma pontada de preocupação me perpassou. Será que eu havia intimidado o senhor?
- Poxa, que bacana! Eu to aí , com 82 anos e formei em filosofia ano passado!
Fechei meu livro na mesma hora. Definitivamente o que eu disse não intimidaria aquele homem. Comovida com o seu exemplo e envergonhada pela minha indiferença abri um sorriso enorme, parabenizando-o pela vitória.
- Que isso menina, obrigada! Ó, só menina. A gente vale pelo que sabe, e não pelo que tem!
O elevador parou no segundo andar.
Antes de sair, segurando a porta com as mãos ele olhou pra baixo, deu uma risada e disse:
-E conseqüentemente quem não sabe nada, não vale nada não é?
Deu de ombros e deixou que a porta se fechasse.


Pensei em vários finais, uns comoventes e outros até mesmo engraçados para terminar esta crônica. Mas decidi que ela vai acabar assim, direta e simples, como aquele senhor.